As Monogravuras de Lurdi Blauth

Armindo Trevisan

Lurdi escolheu, como expressão artística preferida, uma das mais antigas manifestações da criatividade humana: a gravura. O homem pré-histórico ignorou a escrita; mas, a seu modo, também escreveu, ao imprimir sobre as paredes úmidas das cavernas  as silhuetas das mãos, e signos relacionados com a magia.

Lurdi não se atém unicamente à gravura; privilegia uma das suas formas, a xilogravura, que tem como suporte um material maleável, cujo grafismo precisa ser extraído igualmente da matriz. A madeira, porém, presta-se por sua docilidade à inspiração; e por sua vida (embora no último degrau) participa mais da expressão, enriquecendo-a com suas texturas. Da gravura o que lhe interessa, a rigor, não é a imagem, que hoje tem por veículo a fotografia e outras modalidades de reprodução; e sim, a sua dimensão estética. Interessa-lhe a cor-imagem. Enfim, interessa-lhe, no máximo grau, a originalidade, o caráter pessoal e intransferível da imagem que, de certo modo, a torna inesquecível, permitindo ao artista a autêntica criação plástica. Daí sua opção pela monogravura.

Como procede a artista? Num primeiro momento, aparece como a fonte figurativa das séries. Num segundo momento, as imagens tornam-se alusivas. Num terceiro momento, chegamos ao reino da metáfora, onde só uma leitura cuidadosa e sutil possibilita ao contemplador a decodificação de suas preferências concretas, e a identificação de mitos que a impregnam. É aqui que a poesia (visual) se sobrepõe à prosa (da execução, sempre exemplar em termos técnicos). É claro que a exigência formal persiste, e até com exigências maiores. Não obstante, a expressão já não é emocional; é objetiva. Cabe-nos registrar a satisfação de ter surpreendido, ao seu trabalho, uma tal ou qual cintilação, que confere à transpiração da artista, à sua obstinada luta contra a matéria, sobre a matéria, através da matéria, a alegria de uma descoberta. A descoberta fundamental da presença do homem, inclusive com sua solidão e angústias, na aparente neutralidade de cores e linhas.